Conheço um pouco das teorias da Amanda Palmer desde 2015, quando vi e chorei pela primeira vez com a TED TALK maravilhosa que ela fez em 2013. E aí mês passado (dois anos depois) eu comecei a ler o livro que nasceu por causa da palestra, depois que toda a internet já leu e falou e escreveu sobre. Mas estamos aí.
O "A arte de pedir" é um livro sobre a vida, e principalmente a carreira da Amanda como artista, primeiro estátua viva e depois vocalistas de bandas ou cantora solo, e como a rainha do crowdfunding (financiamento coletivo para projetos). É um retrato sincero sobre partes da sua vida e da pessoa que ela é, e cheio de identificações.
Minhas identificações começaram conhecendo uma Amanda surtando sem conseguir dormir, brigando com a própria cabeça e antecipando o que o mundo iria dizer sobre a decisão dela aceitar ou não ajuda financeira do próprio marido. Só alguém que já ficou horas brigando com a própria cabeça, antecipando julgamentos e situações e brigas e querendo não ser tão louca sabe como é horrível isso.
Minha terapeuta diz que eu fico assim por não ter resolvido a questão, mas tem horas que eu não sei se isso é verdade, ou se eu só acredito nisso para me confortar. ¯ \ _ (ツ) _ / ¯
É muito impactante ver a "Rainha do pedir" sofrendo por não conseguir pedir. É muito real, mais ou menos como não conseguir seguir os próprios conselhos e reconhecer que há situações em que suas próprias verdades não conseguem te fazer agir ou sentir da forma como deveria e acha certo. Porque não é tão simples assim, sentir e ser é demasiadamente difícil em alguns momentos. E não adianta nada a gente ficar dizendo para si mesmo que é diferente disso, que deveríamos fazer o que acreditamos, porque não vai funcionar. Não até que alguém nos ajude a sair dessa, ou aconteça algo que nos obrigue a sair dessa porque é muito maior do que a nossa treta. Algo que doa o suficiente.
Saber que ainda continuamos sentados no prego porque não dói o suficiente não ajuda a fazer com que nos sintamos melhor — Relato de quem tentou ficar repetindo pra si mesma que não doía o suficiente para justificar porque não conseguia sair do lugar.
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Antes de começar a ler o livro, eu finalmente consegui entender de forma real, graças a Jout Jout (sempre ela), a Síndrome do impostor (depois fiquei me perguntando: Jout Jout já leu Amanda Palmer?). As pessoas que eu leio por aí, sempre que falavam da Amanda ou do livro sempre falavam da Síndrome do impostor e de vulnerabilidade (chegarei lá também), e sabe, quando você entende algo, mas ao mesmo tempo parece que ainda não entendeu de verdade? Era eu com a tal Síndrome. Acho que pra mim o problema ficou nos exemplos focados em artistas e na história de baterem na sua porta etc.
Após o real entendimento, eu comecei a perceber que me sinto uma impostora até indo na padaria, e me questionar do que sou eu sendo afetada pela síndrome do impostor e o que sou eu reconhecendo minhas limitações? Por exemplo, eu sei que sou maravilhosa e acho um absurdo alguém não me amar e não me achar maravilhosa, AO MESMO TEMPO, que sinto que tô enganando meu namorado quando ele diz que sou muito maravilhosa. E sinto que tô passando a imagem errada e enganando todo mundo quando meus amigos dizem que tenho uma auto estima muito boa (será que vocês já me viram me sentindo não suficiente num sábado a noite qualquer?), ou que sou bem resolvida (!) sendo que eu fico brigando com minha cabeça de 3 à 5 vezes por semana. Comecei a mentalizar que isso é a Síndrome do impostor me fazendo sofrer para ver se ajuda.
E tem as vezes em que as pessoas parecem ver em mim uma capacidade ou inteligência que eu não sinto que tenho de forma alguma; e eu tenho certeza que nesses casos sou eu reconhecendo minha limitação, e provavelmente fingindo e enganando todo mundo muito bem ahahah Sinto que tenho certeza nesses casos, porque toda vez que alguém me trata como uma imbecil (e isso acontece bastante no meu serviço) eu sei que aquela pessoa está sendo cruel porque eu tenho capacidade suficiente naquele assunto pra não ser tratada como tal e ser ouvida.
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E então vem o medo de pedir. Cresci ouvindo que ajudar é melhor que ser ajudado, e parece uma boa frase, até você começar a perceber que isso não vem da felicidade em não estar passando nenhuma necessidade, e sim da ideia de que quando você pede você é inferior. E logo eu, filha da mãe que escutou a professora da 1º série dizendo que a filha não gostava de ajudar nem ser ajudada. Juro que melhorei na parte de ajudar... Pedir é difícil.
O medo de pedir é o fruto do medo de não ser suficiente e não merecer ajuda, amor,
aceitação, reconhecimento. O medo de se abrir, se expor e não ser
acolhida. O medo de não ser boa o suficiente, para merecer pedir, o medo de não ser bem sucedida o suficiente, o medo de não ser bonita, ou inteligente, ou engraçada...
Pedir não é bem visto, nada que quebre a imagem de pessoa inabalável e "acima de tudo" é bem visto. Sentimentos não são bem vistos. Estar vulnerável não é bem visto. Ou é cafona ou é fraco. Nem vamos falar dos milhões de personagem com lema "amor é fraqueza". Inclusive devo ter um ou outro... Passado sombrio.
Mas de verdade, as conexões reais só são realmente feitas e solidificadas quando nos abrimos e mostramos realmente quem somos. Só nesses momentos a gente consegue compartilhar do sentimento de pertencimento. Como quando você confessa uma coisa vergonhosa para alguém e esse alguém diz "eu também!" de volta, e aí nem parece mais tão vergonhosa, porque a vergonha é substituída por entendimento mutuo e identificação com aquele outro ser.
Curiosidade: A sensação de não ser suficiente é maior entre as mulheres, segundo
Brené Brown. E isso me deixa triste, mas não espantada quando a gente
cresce num ambiente em que a mulher nunca é boa ou bonita o suficiente,
que é a culpada pelos absurdos que fazem com elas, que aprende que as
outras são as inimigas.
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Não posso deixar de falar do processo criativo e do liquidificador da arte, e da falta de reconhecimento de que o processo criativo não é só o trabalho duro enquanto se cria.
Desde o começo do livro a Amanda fala sobre coletar os pontos, conectar os pontos e depois transformá-los em uma arte final. Alguns são melhores coletando, outros conectando, outros transformando. Mas todas essas etapas são parte do processo criativo. Por isso se fala tanto para escritores lerem, músicos ouvirem, etc. e para todo artista observar o mundo, e absorver arte. As formas de coleta e conexão são várias e não existe uma certa. Nada vem do nada e nem vai para o nada.
Todas os meus amigos e amigas que escreverem e com os quais tenho mais contato, vivem se debatendo e julgando por perder tanto tempo pensando, ou fazendo playlist ao invés de sentar e escrever. Há um ponto entre o que é fazer playslist ou ficar encarando o teto do quarto pensando e o que é procrastinar por medo de não ser bom o suficiente (ser uma fraude). Esse ponto é onde estamos fazendo conexões e melhorando nosso trabalho.
E a coleta para uma obra pode durar muito tempo. e ela começa ates de você ter ideia para uma obra, e algumas vezes continua por mais bastante tempo depois dessa ideia.
Entre a conexão e a criação final, entra o liquidificador da arte.
Encarando que toda obra de arte carrega traços do autor dela vem a
teoria do liquidificador. Você pega alguns dos pontos coletados e os
mistura, transformando no produto final, o quanto dos pontos coletados
que poderão ser visto na arte final está indiretamente ligado com a
velocidade do liquidificador. Quanto menor a velocidade, mais fácil
identificar as inspirações. Descobri que meu liquidificador está em
velocidade baixa há um tempo, infelizmente Amanda não disse se há uma
forma consciente de aumentar essa velocidade. Aceito ajuda!
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Eu fiquei lendo o livro e juntando os pontos do que eu lia com a vida
ao redor. E nem sempre isso é reconfortante, mas pelo menos era bom
fazer as conexões.
Amanda fala muito da importância da
comunicação sincera com o público; enquanto isso eu acredito e sei que o
dialogo e as conversas ajudam imensamente e, às vezes, são a única
solução*, principalmente nas minhas questões. Mas alguns dias eu fico
mal e eu não quero ter que conversar e interagir, mesmo sabendo que o
que vai me deixar bem
é exatamente conversar e interagir com
minhas pessoas. Pensar em responder mensagens é desgastante, mas eu sei
que a única solução vai ser conversar. E aí o mundo explode, porque eu
preciso fazer algo que a principio me deixa mal, pra depois me deixar
bem. Como lidar?
*De verdade, falem, conversem, dialoguem, —
consigo mesmo e com os outros ao redor — o máximo que der. Infelizmente
cara feia não resolve nada. E acreditem, eu sou a pessoa que mais queria
que resolvesse haha
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Encerarei pedindo para vocês comentarem meus posts, mesmo que achem que não tem muito a dizer, porque é muito bom ler comentários. E leiam A arte de pedir. E meus textos e minhas histórias!