30.7.17

Hygge, um conto

Oi, mundo!

Dia 19 desse mês, fez um ano que eu publiquei meu primeiro conto, Quarto minguante lá no Wattpad, vieram outros depois desse, nenhum aqui no Luft. Mas hoje nessa manhã de domingo será o dia em que tudo mudará! SIM, TEMOS CONTO NOVO E INÉDITO!!!

Para um blog de nome sem tradução, um conto de título também sem tradução: Hygge. Lê-se "hoo-ga", é uma palavra do dinamarquês, segundo o dicionário do bem, que significa entre outras coisas, "ter prazer na presença de coisas leves e suaves, paz". E pareceu o único título possível para minha história que no final é só sobre a paz e o prazer nas coisas simples e pequenas de uma manhã de domingo tranquila. Espero que vocês também se sinta em paz lendo!

Sem mais delongas...



Os raios de sol fazem um caminho da janela até a mesa de madeira, refletindo no vidro da tigela com uma dúzia de laranjas, ainda em processo de amadurecimento, que mamãe comprou ontem na feira. O centro de mesa com crochê embaixo da tigela está amarrotado — eu o estico. Encho um copo com água da torneira e sento na ponta da mesa para não interromper o caminho da luz. 
Ouço o vizinho falar com seu cachorro; são 07:56 da manhã, eles devem estar prestes a sair para correr. Bebo a água enquanto acompanho com os dedos os bordados de rosas amarelas e folhagens verdes no centro de mesa. Consigo ouvir o vizinho e o cachorro descerem as escadas e fico na espera da batida alta do portão de ferro ao ser fechado.
Completo a água no copo mais uma vez e abro a janela para regar o cacto e as suculentas no peitoril. Tomo cuidado para não colocar água demais nos três pequenos vasos coloridos. Amarelo para Órion, o cacto, rosa para Alnitaka e roxo para Mintaka. Alnilan, a terceira das suculentas e a segunda das Marias na constelação, morreu há dois meses; seu vaso era turquesa. Agora ele fica escondido na área de serviço, retirado de sua função.
Quando acabo, deixo a janela aberta e a brisa fria faz com que os pelos dos meus braços se arrepiem. Vou atrás de algo para esquentar e encontro o cardigã verde escuro de mamãe esquecido sobre o sofá. Ele sempre parece mais macio e quente do que qualquer um dos meus. O tecido pesado faz um contraste engraçado com minhas calças e a blusa fina do meu pijama listrado ao colocá-lo. Com a pouca luz na sala a essa hora, os sofás parecem especialmente convidativos, mas meu estômago ronca e tenho de voltar para cozinha. Assim que ligo o fogo para fazer chocolate quente ouço a porta do quarto se abrindo e mamãe caminhando até o banheiro. Ela conversa animada com nossa gata, Geórgia, sua voz ecoa pelo corredor.
Mamãe entra na cozinha alguns minutos depois, de moletom azul marinho combinando e cabelos presos. Ela beija minha testa ao me dar bom dia, Geórgia vem logo atrás dela e se esfrega em minhas pernas; eu acaricio o pelo malhado do lado do seu corpo com o pé, tomando cuidado para não me desequilibrar e nem parar de mexer o leite. Mas não consigo manter o equilíbrio por muito tempo e desisto.
— O que você está fazendo, filha?
— Chocolate quente — digo e ela emite um som de satisfação.
— O que acha de biscoitos para acompanhar? E talvez pão de queijo? — Ergue as sobrancelhas para mim. Eu sorrio. Mesmo que pão com manteiga tenha todo o charme do mundo, eu não reclamo de variar um pouquinho. E hoje é domingo, isso pede refeições diferentes.
Mamãe diz que volta em um minuto e sai pela porta em busca da nossa comida, e Geórgia se cansa dos meus pés e sobe em uma das cadeiras da cozinha. Toda a companhia que tenho. Isso me deixa em paz. Quando mamãe volta, os chocolates quentes já não estão mais tão quentes, estão do jeito que gostamos — mas que ela nunca consegue esperar ficar quando está por perto e sempre acaba com a língua queimada. Ela coloca o saco de biscoitos em cima da mesa e prova do seu chocolate. Diz que está delicioso e me agradece por tê-la esperado. Balanço a cabeça como se não fosse nada.
O pão de queijo tinha acabado, segundo mamãe, a próxima fornada ainda iria demorar uns dez minutos para sair, a padaria estava movimentada e ela achou melhor não esperar. Mas eu não me importo, ter biscoitos no café da manhã sempre me faz acreditar que aquele será um bom dia. A massa crocante por fora e macia por dentro, ainda quente, o gosto salgado que fica em minha boca, e que vai embora depois com o chocolate quente, eu adoro cada detalhe. Mamãe molha seus biscoitos na caneca de leite antes de comê-los — houve uma época em que achava isso um tanto nojento, mas hoje não. Acabamos devorando o saco todo de biscoitos, como duas crianças, enquanto conversamos.
Mamãe fala de um vestido que viu na vitrine da sua loja preferida — caro demais, vamos esperar por uma liquidação. Falo sobre o próximo lançamento daquela poeta que gostamos — não me lembro mais a data, mas mamãe acha que é em novembro. Pergunto sobre a viagem que vovó fará para o nordeste — daqui a um mês, ela ficará cinco dias fora e quer comprar um óculos de sol novo. Ela pergunta se sairei com meu pai à tarde — esse final de semana não combinamos nada—, ou com Juliana — também não combinamos nada. Eu pergunto sobre o homem que ela saiu na sexta — ela não respondeu a mensagem que ele mandou ontem. Ela pergunta se eu achei alguém naquele aplicativo — É Tinder, mãe, e não, eu desinstalei.
Nos atualizamos da vida uma da outra. Não há pressa, nem barulheira. Ninguém precisa chegar ao serviço em 20 minutos ou conseguir estar em dois lugares ao mesmo tempo ou revisar uma matéria para entregar até o almoço. Domingos são sagrados para ficar em paz. Não ouvimos músicas, nem no rádio, nem em nenhum aplicativo de streaming. A música errada pode simplesmente cortar o silêncio da forma incorreta e quebrar a atmosfera. O mais perto de música que chegamos é quando mamãe, e algumas vezes eu, cantarolamos enquanto lavamos a louça ou preparamos algo para o almoço. E não lemos notícias.
Simplesmente nos desligamos de tudo, e nos concentramos na nossa paz aqui, nesse tempo e espaço, em casa uma com a outra. Manhãs de domingos são sagradas para descanso. 

***

Obrigada a Gih, a tati e a Dani que ajudaram a melhorar e deixar Hygge como está agora. Vocês são ótimas ♥

Se você gostou de Hygge, você pode me ajudar compartilhando esse post ou comentando o que achou!

Tchauzinho! 

6 comentários:

  1. Um nunca tinha usado o wattpad, nem sabia o que era (Berro). Mas o Felipe acabou me introduzindo nesse mundo, nem foi tanto isso, eu q queria ler Não sei lidar e agora tenho sua história, já tô curiosa, vai pra minha lista. Adoro saber q pessoas "próximas" estão publicando suas coisas, dá orgulhinho. Parabéns

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. !!!!
      Obrigada, Taiany, gosto de saber que fui para sua lista :) espero que curta a leitura, e vou adorar saber sua opinião depois :D

      Excluir
  2. LENA!

    Fui reler agora e ele já é o conto mais fofinho que eu já li esse ano. Ele me deixa com uma nostalgia gostosa da infância, da casa da vó, etc. É MARAVILHOSO! Quero mais coisinhas escrita por ti ainda esse ano!

    beijos,
    tati

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. TATIII!
      É maravilhoso saber que ele causa isso, sério :))))
      Vou tentar não te desapontar, tomar vergonha na cara e escrever!

      abraço,
      Lena

      Excluir
    2. A GENTE ESCREVE JUNTAS, GRITA QUE A GENTE ESCREVE!!!

      Excluir