12.8.16

O amor e o tempo

O TEMPO 

Tudo cura o tempo, tudo faz esquecer, tudo gasta, tudo digere, tudo acaba. Atreve-se o tempo a colunas de mármore, quanto mais a corações de cera! São as afeições como as vidas, que não há mais certo sinal de haverem de durar pouco, que terem durado muito. São como as linhas que partem do centro para a circunferência, que, quanto mais continuadas, tanto menos unidas. Por isso os antigos sabiamente pintaram o amor menino, porque não há amor tão robusto, que chegue a ser velho. De todos os instrumentos com que o armou a natureza o desarma o tempo. Afrouxa-lhe o arco, com que já não tira, embota-lhe as setas, com que já não fere, abre-lhe os olhos, com que vê o que não via, e faz-lhe crescer as asas, com que voa e foge. A razão natural de toda esta diferença, é porque o tempo tira a novidade às coisas, descobre-lhes os defeitos, enfastia-lhes o gosto, e basta que sejam usadas para não serem as mesmas. Gasta-se o ferro com o uso, quanto mais o amor? O mesmo amar é causa de não amar, e o ter amado muito, de amar menos.

Primeiro remédio — Sermão do Mandato. Pe. Antônio Vieira (1643)
"...sobre as palavras que tomei, tratarei quatro coisas, e uma só. Os remédios do amor e o amor sem remédio..."
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As linhas que partem do centro da circunferência é como o amor de mãe que continua mesmo quando os filhos voam para longe, o amor menino são os cúpidos, que jamais são velhos. E "o ter amado muito, de amar menos" é sobre os receios que levamos para o amor que segue aquele em que amamos demais e com tudo de nós.

Esse texto é o tipo de coisa para quais a gente é apresentada, no início de uma noite de quinta em algum ponto no meio da rodovia, porque sua amiga é estudante de Letras. E eu precisava guardá-lo em algum lugar. O último paragrafo é uma transcrição com minhas palavras das palavras dela.

-H.

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